É uma casa que fica ali no adro, logo em frente da igreja. Fizeram-na há cento e tal anos, para os comércios desse tempo. A casa possuía a dignidade de quem a construiu, tinha as formas e atributos que a vida lhe pedia: um alprendre lateral, uma porta de serviço aos altos da habitação, e as três portas principais abertas à freguesia.
Um dia chegaram ao largo, de mãos dadas, a liberdade e a cidadania. E a junta velha fez da casa a sua Sede, com obras que por milagre a não arruinaram. Porém agora veio a junta nova, a quem calhou a roda da fortuna com o dinheiro das eólicas. Deliberou que havia portas a mais, resolveu entaipar três. Sobraram três janelicos de alumínio anodizado.
O trabalho é um atentado, é crime, é malfeitoria? À junta pouco lhe importa, que o seu dever é cumprir o programa do bom autarca moderno: dar vazadouro às finanças e ter obra para mostrar. Não há tutela que valha, nem protesto, nem juiz. Nem consideração estética, nem história, nem património. Nem passado, nem presente, nem futuro. Que o arbítrio dum autarca é soberano, mesmo quando é terrorismo.
Faz lembrar a parábola das pérolas e dos porcos. E chega a deixar saudades dum tempo de má memória, já distante.