Além de ser um homem das arábias, o avô Germano era perdido por caça. Não juro agora que respeitasse o defeso. Mas nesse tempo havia bicharada, não era o que hoje se vê. Saía um homem de casa de escopeta em bandoleira, e logo duas lebres lhe saltavam ao caminho, a ensaiar uma quadrilha. E era assim que avô Germano, quando lhe dava na gana, pegava no bacamarte, prendia à cintura o polvorinho, e ala para a serrania.
Quando cheirava a Outono, logo ao dia da abertura, lá estava a malta do Porto. E durante um par de dias, monte cá, monte lá, não havia brejo que escapasse à fuzilada. Traziam grandes matilhas, e usavam carabinas que cuspiam cinco tiros. Um dia à noite partiam, com rosários de perdizes a pendular nas janelas das carripanas escuras. M'amigo, desta maneira, qualquer um bota figura!
Um dia o avô Germano resolveu tentar-lhes o exemplo. E na escopeta, que atulhava pela boca, despejou cinco vezes a colher do polvorinho. Atacou as estopas com cuidado, multiplicou por cinco os bagos da chumbada, esmerou-se na bucha de cobertura. E emboscou-se à beira do ribeiro.
Quando enfim deu ao gatilho foi ali o fim do mundo. Um relâmpago fatal entrou-lhe pelos ouvidos, e o coice foi de tal ordem que o avô Germano foi aterrar de costas a dez metros de lonjura.
Com tamanho estardalhaço, lá foram dar com ele por baixo dumas giestas, mal dava acordo de si. Porém, ao dar-se conta da aflição dos camaradas, avisou:
- Cuidado com a besta, que ainda tem quatro lá dentro!
E aos poucos voltou a pôr-se de pé.