quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

A história duma ideia perigosa 7

(Cont.)
«O dinheiro que o BCE deu aos bancos foi utilizado para comprar alguma dívida governamental de curto prazo (para baixar um pouco os juros das nossas obrigações) mas a maioria ficou no BCE como seguro de catástrofe, em vez de circular na economia real e ajudar-nos a voltar ao trabalho. Afinal estamos no meio duma recessão que está a ser dinamizada por políticas de austeridade. Quem é que havia de contrair empréstimos e investir no meio daquela confusão? Toda a economia está em recessão, as pessoas estão a reembolsar as dívidas e ninguém está a pedir dinheiro emprestado. Isso faz com que os preços caiam, provocando cada vez maiores imparidades nos bancos e tornando a economia cada vez mais esclerótica. 
Não há literalmente nada que possamos fazer. Precisamos de manter os bancos solventes ou desmoronam-se, e são tão grandes e estão tão interligados que, mesmo que fosse apenas um a ir-se abaixo, isso podia fazer explodir todo o sistema. Por mais horrível que seja a austeridade, não é nada comparada com um colapso geral do sistema financeiro.
Portanto, não podemos inflacionar e transferir o custo para os aforradores, não podemos desvalorizar e transferir o custo para os estrangeiros, e não podemos incumprir sem nos matarmos, pelo que precisamos de desinflacionar, durante o tempo que for necessário para que os balanços desses bancos ganhem qualquer forma sustentável.
É por isso que não podemos deixar ninguém sair do euro. Se os gregos, por exemplo, saíssem do euro, talvez fôssemos capazes de aguentar. Mas não se pode vender a Itália. É muito. O risco de contágio destruiria os bancos de toda a gente. Portanto a única ferramenta política que temos para estabilizar o sistema é toda a gente deflacionar em relação à Alemanha, que é uma coisa realmente difícil de fazer mesmo nos melhores tempos. É horrível mas é isso. O vosso desemprego salvará os bancos, e de caminho salvará os fundos soberanos que não conseguem salvar por si os bancos, e assim salvar o euro. Nós, as classes políticas da Europa, gostaríamos de lhes agradecer o vosso sacrifício.

Isto é um discurso que você nunca ouvirá. Mas é a verdadeira razão pela qual todos precisamos de ser austeros. Quando o sistema bancário se torna demasiado grande para resgatar, o negócio de risco moral que iniciou tudo torna-se "risco imoral sistémico" - uma trama de extorsão com a ajuda e encorajamento dos próprios políticos eleitos para servir os nossos interesses. Quando esse negócio se faz num conjunto de instituições que é incapaz de resolver a crise que enfrenta, o resultado é a austeridade permanente.»
[Austeridade, Mark Blyth, Ed. Quetzal, Out. 2013]

[É esta a grande armadilha em que todos nos encontramos! Não todos, claro, só a maioria esmagadora!!!]