sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Fim de semana no Cartaxo

Assim, tal e qual, ouvi eu o relato.

Eles, a Celeste e o Amândio, são novos, casaram o ano passado por esta altura. Têm o mesmo olhar, os mesmos gestos doces, coisa rara! E já fizeram um ano de casados!
Os outros, os velhotes, são pais dele. Ela com 76 e ele a caminho dos 80 adoçam-me mais a alma do que uma noite de luar em Agosto. Ela tem excesso de peso e sabe-o. Diz que come pouco, mas traz escondidas nos bolsos do avental, no meio dos panos da loiça, amêndoas e outras lambarices. É já ele que a ajuda no banho matinal e que a veste.
- Sabe, quase não posso mexer este braço e nem sei porquê! - diz-me ela, lamentando a situação. Ele faz que não ouve e vai mostrar-me o quintal.
- Aqui já tirei a primeira revoada de batatas, das que vai comer logo. Agora está cá o feijão preto, que é mais tardio. Gosto dele, mas tem que se lhe tirar a casca. Gosto dele mesmo com ela! - digo-lhe eu. Olhou-me e encolheu os ombros, como quem me dá um desconto, que sou da cidade.
- Deste já se tem comido, do outro mais além é para secar. E aqui está a couve lombarda, veja que fechadinha, até dá gosto! Disse que fazia o caldo para a noite, não foi?! Então levamos de cá uma, vai ver que é tenrinha. Aqui temos os tomates, já apanhei alguns pela manhã. E alfaces e pepinos também, que a Celeste disse-me que é como a gente, que gosta de tudo! Mais além, está a ver, são o resto das batatas que nos dão para o ano. São para todos, filhos e quem cá vier. Veja como já estão bonitas as uvas! O ano passado não nos veio ajudar às vindimas, mas este ano tem de vir! É uma festa, comemos e bebemos. Mas nessa altura já tenho os meus oitenta!
Eu já sabia. Por isso é que os filhos andam a pôr um gradeamento novo e a pintar o muro.
- Ali a laranjeira não sei o que lhe deu, que ainda tem laranjas! A tangerineira não, levou-lhe o vento a flor e nem se lhe viu a cor. Mas o limoeiro cá está, e o pessegueiro também. São pequenitos, os sacanas dos pêssegos, mas doces como o mel. As favas e as ervilhas vamos apanhá-las para a semana. Já de lá tirámos muitas, e a sementeira nem foi grande, não senhor! Cebolas ainda aqui estão estas todas, vão secando. Que as outras, as melhores, estão além prontas para ser encabadas. E vamos lá, que nos chamam para o lanche!
Lá fomos. Pão de forno de lenha, com uma só faca, cada um corta o pedaço que quer. Umas tiras de carne assada numas brasas ao lado, uma omelete com salsa, cebola e chouriço, um bolo de chocolate e um pedaço de bola de carne, a tirar o ar campesino à mesa. A completar, uns copitos pequenos, para encher dum vinho caseiro, do Cartaxo!
Ainda aprendi a encabar as cebolas, e pensei que não precisava de tanto, para ser feliz.