quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Manchas na pintura, superstições, atavismos...

Enquanto espero, vou comprar o Notícias de Viseu, é lá que estou, para conhecer as propostas do Teatro Viriato. Sobre isso, o jornalinho é omisso. Mas fico a saber outra coisa importante.
A ESE do IPV tem 150 alunos no curso de Artes Plásticas e Multimédia. E anda por lá uma polémica acesa, a propósito do modelo nu. Nas aulas da cadeira são utilizados esculturas e esqueletos, ou imagens da Internet. Mas o mestre há muito que defende as vantagens do modelo humano nu. E lamenta que a escola os não contrate, aparentemente "por motivos morais". Já o presidente da ESEV considera fora de agenda um tal assunto.
O Notícias foi ouvir seis estudantes da ESEV, através do Facebook. E estes são os depoimentos:
- Não é necessário termos uma figura humana real, para sabermos as proporções e conseguirmos desenhar. Existem outras formas de fazer esse trabalho, como por exemplo o recurso a bonecos articulados. No decurso das aulas, temos conseguido aprender sem necessidade de modelos nus. Penso que actualmente o ambiente não é propício à presença de corpos nus na sala de aula. Talvez ninguém o verbalizasse, mas creio que todos nós iríamos sentir um certo desconforto.
- Seria muito vantajoso termos desenho e pintura de modelos nus, pois é mais fácil aprender vendo os movimentos do corpo, as suas formas puras. (...) A minha irmã está em Artes Plásticas no Porto, onde tem desenho com modelos vivos, e eu vejo como ela tem progredido (...).
- Não sei, mas pelo que observo aqui, penso que a existência de modelos nus nos poderia levar a uma banalização do corpo humano e não à sua elevação artística. (...)
- Eu acho que seria uma vantagem o recurso a modelos pois poderíamos observar directamente o corpo humano. Provavelmente este assunto envolve questões morais, mas a nudez é bela, é verdadeira, e não deveria haver pudor em a mostrar. (...) Devíamos aprender a olhar o mundo tal como ele é, com os olhos e os sentidos.
- Os recursos alternativos - fotos, estátuas, etc - não permitem perceber a anatomia humana. (...) Falta-nos a pele, e esta só poder ser devidamente percepcionada através de modelos nus.
- Eu sou a favor de aulas com modelos nus, até porque isso iria contrariar a tendência para a banalização da nudez como algo de reprovável e contribuir para mudar as mentalidades, promovendo a sensibilidade artística.
O último depoimento é masculino. E a ESEV leva um grande avanço à América profunda, onde estados como o Kansas já proibiram a exposição escolar do evolucionismo, sem o contraponto do criacionismo. Falta-lhes ainda negar o heliocentrismo, repudiar Copérnico e Galileu, e a ciência, e a história, e o Renascimento europeu. Com calma e um par de Colts à cinta, um dia lá chegarão. Mas à ESEV não, onde há quem olhe o mundo tal como ele é, visto com os olhos e os sentidos. 
Embarco enfim no autocarro que me leva ao meu destino, mesmo ao nascer duma lua redonda e friorenta.