O que se passa em Portugal há décadas, na gestão das faculdades de medicina e na formação de novos médicos, devia fazer-nos reflectir. Porque mostra exemplarmente o género de políticos e a espécie de médicos que nos têm tratado da Saúde.
Impossibilitados de aceder às faculdades de medicina por limitações e numerus clausus de natureza perversa, 1300 jovens portugueses frequentam actualmente cursos na Europa: em Espanha, na Chéquia, em Malta, em cascos de rolha.
Centenas de milhares de portugueses não têm médico de família.
Em 34 municípios da região norte havia, em 2008, menos de um médico por cada mil habitantes.
Em muitas regiões do país, os concursos para médicos de família ficam sistematicamente desertos.
Há muitos anos que Portugal contrata os médicos que não tem em Espanha, no Uruguai, na Papuásia, onde os houver.
Mais de metade dos médicos inscritos na Ordem tem hoje mais de 50 anos.
Um médico em cada oito tem mais de 65 anos.
Em resultado das duas anteriores, muitas escalas da urgência alimentam-se de turbo-médicos.
Em Moçambique há 800 médicos, e em Angola 2400.
E no entanto, a propósito da abertura dum curso de medicina na Universidade de Aveiro, o bastonário da Ordem dos Médicos não tem parado de verberar a decisão do governo, porque dentro de poucos anos haverá médicos no desemprego.
Uma atitude assim é um despautério escandaloso. Ao bastonário dos médicos é indiferente que o país se transforme e evolua, ou siga sendo o logradouro da bicharada, atávico e tolhido há muitas gerações. Importante é mantê-lo neste regime de captura, ao serviço dos seus interesses corporativos.
Mais vergonhosa do que isto só a atitude dos governos, e dos inúmeros ministros da Saúde, que há décadas são cúmplices deste regabofe.
O governo actual vem finalmente agitar as águas turvas. Isso explicará o frenesi com que uns farsantes, e outros videirinhos, lhe pedem a cabeça.