sexta-feira, 12 de junho de 2015

Apeadeiros

Há um par de dias, o comboio chegou tão atrasado que eu já temia o pior. Pior seria ter ela desembarcado no mesmo apeadeiro de há um século.
Na ocasião vínhamos ambos à aldeia, a bem dizer em romagem de saudades. Eu chegava de Lisboa, lá trepei a uma couraça de Coimbra e encontrei-a. Tinha ela para trazer uma mala de faianças, arranjada por uma amiga, dos despojos duma fábrica que já desapareceu. E foi assim que apanhámos o regional da Beira.
Foi-se o Luso, foi Mortágua, passou Santa Comba Dão. E durante a madrugada parámos numa estação, a próxima era o destino. Foi então que apareceu o tal apeadeiro.
O comboio estacionou no meio da escuridão, havia uma plataforma com duas luzes ao fundo, uma passagem de nível, e uma construção perdida ali no descampado. E ela, muito agitada, que estamos em Celorico, temos que sair agora. Saltámos fora. E de repente ficámos nos braços da noite escura, com uma mala pesadíssima na mão.
Meti o cinto na argola, pendurei-o a tiracolo, e lá fomos, linha fora, a saltitar nas travessas. Mas andar era um tormento. A distância entre as travessas era menor que a passada, e as bermas eram cascalhos onde brincavam regatos. 
Rompia o dia caí num banco da gare. Até que, por puro dó, uma alminha caridosa aceitou deixar-me em casa.
Nunca nenhuma iguaria me compensou do tormento, a recender na baixela. Ou sou eu que sou frugal, ou me tento pelos atalhos!