terça-feira, 16 de setembro de 2014

Sepúlveda e naufrágio

O Manjalero era cantineiro na Angónia, lá para os confins do Malawi. Vivia com a mulher mesmo à beira da picada, debaixo da mangueira. E quando rebentaram os tumultos e o sertão se amotinou, deixou de sair de casa.
Um dia ia a entrar para a camioneta. Cercaram-no ali, levaram-no para o terreiro e ataram-lhe os pulsos ao tronco do mamoeiro. Tiveram-no lá dois dias. Passava um, pegava no bambu, estendia-lhe no lombo um par de bordoadas. Passava outro e descarregava-lhe a raiva na barriga das pernas. Isto enquanto recitavam entre dentes uma ladainha que não se decifrava.
A mulher vinha num choro de silêncio, trazia-lhe comida e confortava-o. Eles à noite prendiam-no rente ao chão, e o Manjalero dormia enovelado no pó.
Ao terceiro dia correram dali com ele. O pobre subiu a mulher para a camioneta, juntou duas maletas na caixa de carga e desapareceu da Angónia.