segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Trabalho infantil

Dentro duma robusta vedação farpada alinham-se as plantitas milimetricamente, amparadas em postes e aramados para se manterem em pé. Instala-se um complexo sistema de cortinados, que as resguardam da geada ou dum cieiro mais vivo. E cada uma tem direito à sua dúzia de pingos por minuto. Simulam chover do céu, mas pingam a meia altura, dum sistema de rega gota-a-gota.
Já vêm educadas do viveiro, com um mestrado em inovação e produtividade, onde nunca se falou de trabalho infantil. E mal lhes enterraram as raízes, desentranham-se logo em frutos, fotocópias uns dos outros.
A esperança média de vida, igual para toda a gentinha, não vai além duma dezena de anos. No dia em que o catrapilo entrar aqui, vai tudo raso para a vala comum. Ninguém se salva, pois que o estado social é uma heresia. E deste modo se garante o campo aberto às novas gerações.
Já no paraíso terreal havia árvores na horta. Às vezes duravam séculos, e tinham troncos rugosos que os pais deixavam aos filhos. Davam sombras e criavam as maçãs do fim do Verão, algumas delas com bicho. Hoje em dia já só restam ecos disso em velhas hortas austríacas, que militam na biodiversidade e cultivam o valor da tradição.