A enxurrada do Natal, mesmo carregado de promessas de penúria, não poupa os escaparates. O mercado, sempre atento e oportuno, desfaz-se mais uma vez em produtos e objectos de consumo. Nos tempos que correm, não é com literatura séria que se faz negócio e que os melões se compram. E os leitores, esses coitados, há muito que só contam enfileirados no rol de consumidores, alienados e acríticos.
Não falta oferta para todos os gostos, o mais dela afiançado pelo prémio Saramago, pobre dele. Lá aparece o Peixoto a pedir colo, como é hábito, e a desfilar dinastias inteiras de Alziras familiares em piqueniques campestres. O hugo mãe reincide no seu requentado neo-realismo, povoado de proletários canhestros, com títulos assarapantados e um estranho fraseado onde ecoam exotismos de quimbos muito remotos. Já o Tordo é de discurso e técnica mais cosmopolitas. Pena é que lá dentro haja tão pouco, no que respeita a densidade e substância. O Tavares sabe o que é a literatura. E põe em prática as suas qualidades quando não perde tempo com enigmas e charadas, à espera que chegue um dia o Nobel que umas pítias já lhe garantiram.
Sobra aos especialistas da matéria, e aos divulgadores domésticos, o estendal dos produtos literários da fábrica anglo-saxã, que nos colonizam e distraem, e nos convencem de que tomamos banho no tanque da cultura. Uns e outros se levam a sério extremamente, o que está longe de ser um bom sinal.
É neste contexto que o leitor muito ganha, e mais ainda poupa, se os deixar a todos em sossego. Ponha a rodar um disco do Erik Satie e recue 30 anos, que foi quando o Mário de Carvalho deu à luz estes Casos do Beco das Sardinheiras que nos levam a uma certa Lisboa, e de que se deixa aqui abaixo um gostinho com O Tombo da Lua. A técnica deste escriba é primitiva, mas clicar talvez ajude a ler.