segunda-feira, 23 de outubro de 2017

Li


 
O melhor será dizer quis ler. Porque apenas consegui passar os olhos por esta bambochata. E o mais grave é que trouxe p'ra casa uma coisa em tempos já lida, porque hoje em dia nada há que valha a pena.
"Elias a caminho de casa é como o cavalo do almocreve: passo batido, paragens certas, meditabundo. Vai. Se desce a Avenida, direcção ao Rossio, pára nuns pontos, se vem pelo Intendente pára noutros, sempre os mesmos. Seja qual for o trajecto tem sítios. Depois é que reconhece se está para norte ou para sul. (...)
É então que vê passar as três jaulas rolantes vindas não se sabe donde. De longe. Certamente da autoestrada do Norte, avenida do aeroporto abaixo, atravessando a cidade. São três transportes de circo, gradeados mas sem feras, que avançam de madrugada. Dentro deles viajam os tratadores com um ar estúpido, ensonado. Desfilam pelas ruas desertas, sentados no chão, pernas para fora, caras entre grades.
Elias deixa de cantar. Durante o resto do caminho pensa nos tratadores enjaulados a atravessarem a noite sobre rodas: o que mais o impressiona é que pareciam vaguear sem destino."