domingo, 3 de julho de 2016

O sol é grande

O sol é grande, caem co’a calma as aves, 
do tempo em tal sazão, que sói ser fria; 
esta água que d’alto cai acordar-m’-ia 
do sono não, mas de cuidados graves. 


Ó cousas, todas vãs, todas mudaves, 
qual é tal coração qu’em vós confia? 
Passam os tempos vai dia trás dia, 
incertos muito mais que ao vento as naves. 


Eu vira já aqui sombras, vira flores, 
vi tantas águas, vi tanta verdura, 
as aves todas cantavam d’amores. 

Tudo é seco e mudo; e, de mestura, 
também mudando-m’eu fiz doutras cores: 
e tudo o mais renova, isto é sem cura! 

[Sá de Miranda, um fidalgo que mandou bugiar a corte, e foi para a quinta do Minho. A escrever sonetos como quem calceta ruas!]